Pulguinha do arroz: o que já se sabe sobre a nova praga das pastagens?

Além do pasto, praga pode atacar culturas como o milho e a soja em sistema de integração; saiba quais as medidas recomendadas para controlar danos

Nesta quinta-feira, 21, o Giro do Boi convidou para entrevista o cientista biológico, mestre e doutor em agronomia Rodrigo Santos, pesquisador da Embrapa Acre na área de manejo integrados de pragas. O especialista revelou quais são as informações que o setor já coletou a respeito de uma praga que passou a atacar pastagens mais frequentemente a partir de 2014, a pulguinha do arroz.

“Essa pulguinha do arroz é, na realidade, um micro besouro que tem a pastagem como uma das suas plantas hospedeiras. Ele já tinha sido relato no estado do Acre atacando arroz de sequeiro em 1996 e, de 2014 para cá, vem se agravando os casos em pastagens, principalmente na época da reforma”, explicou.

Segundo o pesquisador, já existem relatos de ataques do inseto em pastagens de Brachiaria humidocola, Brachiaria brizantha, Capim Tangola e Grama Estrela. “Visto a versatilidade alimentar do inseto, ele tem possibilidade de infestar qualquer tipo de pastagem, qualquer cultivar, já que ele foi observado nas principais cultivares utilizadas aqui no estado do Acre”, alertou.

Além do Acre, a nova praga já foi relatada em outros estados, como São Paulo, Minas Gerais, Maranhão, Tocantins, Goiás, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, e ainda em outros países. Nos Estados Unidos, por exemplo, a praga foi observada em cultivos de milho, sorgo, cana-de-açúcar, trigo e também em forrageiras.

“O complexo de insetos chamados ‘pulguinha do arroz’ é de praticamente 440 espécies descritas ao redor do mundo. Então algumas espécies já foram relatadas ocorrendo nessas outras culturas, como milho, o sorgo, cana-de-açúcar, o arroz. E quanto à espécie do Acre, como é um conjunto muito grande de espécies, não foi possível a gente identificar até um nível específico para saber exatamente qual é”, observou.

O perigo para a infestação da pulguinha do arroz no Acre aumenta à medida que a agricultura começa a ser praticada em maior escala pelos produtores do estado. “Por conta desses outros relatos, o alerta é ainda maior porque essa espécie pode estar se adaptando também a outras culturas. E aqui no estado nós temos uma expansão grande de soja e de milho. Então a pastagem que é trabalhada no sistema de ILPF ou que tem o milho próximo, ela pode também ter uma cultura potencialmente hospedeira”, projetou.

Rodrigo destacou qual é a fase em que os capins estão mais vulneráveis aos ataques da pulguinha do arroz, geralmente relacionados à reforma de pastagem. “A principal fase crítica do ataque do inseto é de quatro a 14 dias após a semeadura, no caso de reforma por semente, ou de três a sete dias, quando utilizada a reforma por mudas. Essa é a fase crítica que deve ser bem monitorada pelo pecuarista porque é a fase de ocorrência do inseto e quando a planta está mais vulnerável”, apontou. “Ela ataca as folhas jovens, tanto na face superior como na fase inferior das folhas, e as larvas, que são a fase jovem do inseto, atacam as raízes”, completou.

O especialista comentou que não há relatos de ataques da praga em pastagens já bem desenvolvidas. “A fase de ataque preferencial desse inseto é quando as plantas são mais jovens e cujas folhas ainda são mais tenras. Seria mais fácil para o inseto fazer a sua alimentação. Essa é a fase crítica, realmente, quando o capim ainda está na fase jovem, ainda que não tenham ocorrido as primeiras brotações ou perfilhos”, sustentou.

Em relação à época do ano em que o ataque é feito, o pesquisador disse que sua ocorrência tem mais relação com o momento em que o produtor planta o pasto na reforma do que com o clima – seco ou chuvoso. “Aparentemente o inseto tem preferência mais pela fase do pasto em detrimento ao clima. Aqui no Acre, geralmente, coincide com a época de chuva, porque é a época que o pecuarista vai fazer sua reforma de pastagem, antes um pouco da época chuvosa, então aqui coincide com a época chuvosa. Mas em outros relatos do surgimento dessa praga em outros estados, concomita com a época de estiagem. Então aparentemente ela tem mais associação com a fase da planta do que com o clima”, frisou.

Embora o prejuízo possa ser grande, a detecção da praga nas pastagens exige atenção aos pequenos – ou aos micro – detalhes, afinal a pulguinha do arroz tem um tamanho de aproximadamente 1 mm. “Isso é um grande problema para a detecção porque, além de ela ser muito pequena, logo quando você se aproxima, ela pula. Ela tem umas pernas posteriores dilatadas (veja abaixo), então realmente ela faz grandes saltos. Então se você não tiver um pouco de olho treinado, você não consegue verificar onde está. Você consegue verificar os danos, mas não consegue verificar o inseto na planta”, salientou.

De acordo com o pesquisador, o inseto verificado no Acre não é o mesmo desta foto, mas a imagem serve para ilustrar sua morfologia externa aos produtores, visto que todos são muito parecidos.

Para o pesquisador, contar com a ajuda de um profissional especialista pode ajudar o produtor a confirmar a existência da praga dentro de sua porteira. “Um profissional pode identificar o dano ou mesmo identificar o inseto na planta porque, apesar de ele ser diminuto, quem tem um olhar mais treinado consegue identificar porque o dano da pulguinha do arroz é diferente do provocado pela cigarrinha das pastagens, que é um dano também diferente do ataque de lagartas. Ela (pulguinha) raspa a epiderme da folha, ela não destrói as bordas, como no caso da lagarta, e também não aparece queimado, como no ataque da cigarrinha. Ela parece um prateamento (veja abaixo), porque você destrói a clorofila da planta, então prejudica a atividade fotossintética da planta e, em altas infestações, pode causar mortalidade da planta ainda jovem. E mesmo em baixas infestações, nós temos o retardo da composição do estande, então vai acabar comprometendo a reforma das pastagens.

Aspecto de folha de plântula de pastagem atacada por Chaetocnema. As áreas cloróticas são causadas pela alimentação do inseto, o que causa perda de área fotossintética à plântula. (clique para ampliar)

Detalhe de plântula de pastagem atacada por Chaetocnema sem chances de se recuperar. Quando o dano atinge esta situação, dificilmente a plântula sobrevive. (clique para ampliar)

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CONTROLE DO DANO E MEDIDAS PREVENTIVAS

Em sua participação no Giro do Boi, o pesquisador da Embrapa apresentou algumas das soluções para diminuir o prejuízo causado pela pulguinha do arroz. Embora nenhum estudo científico tenha sido realizado – deverá ter início em breve, conforme adiantou Rodrigo -, existem linhas de trabalho promissoras.

“Nós verificamos – ainda empiricamente, porque não foi feito nenhum experimento comprovando – que para aqueles pecuaristas que têm utilizado sementes tratadas com inseticidas sistêmicos, eles não têm ataque ou têm um ataque muito baixo da pulguinha do arroz”, afirmou.

A possibilidade, segundo Rodrigo, será agora posta à prova. “Aqui na Embrapa Acre nós iremos iniciar um trabalho juntamente com a Unipasto como parceira para fazer esse teste cientificamente para comprovar essa eficiência da semente tratada em relação à não tratada. Então há no mercado já sementes tratadas com inseticidas sistêmicos ou mesmo aquelas que têm uma proteção de grafite. Com essas sementes, aparentemente quem está utilizando tem menos ataque ou não relatam ataque da pulguinha do arroz, justamente porque a semente ainda fica protegida até a emergência das plantas novas e isso impediria o inseto de estar atuando principalmente nessa fase. Então a ideia nossa é estar comprovando cientificamente para a gente poder recomendar esse tipo de ação por parte do pecuarista”, estimou.

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O produtor que quer atenuar o problema tem ainda uma outra recomendação da Embrapa a seguir. “Outra ação que a gente tem recomendado é para o aumento da taxa de semeadura em até 30% porque isso aumentaria as chances do estande de capim. Mesmo se ele sofrer um ataque, você ainda tem uma sobrevida de plantas para não comprometer a sua pastagem”, justificou.

Em sua entrevista no programa, Santos respondeu dúvida de um produtor que tem propriedade na região do Pantanal sobre a possibilidade de a praga ser transportada na palhada do arroz. “Nós ainda não podemos afirmar isso, mas como o ciclo do inseto se desenvolve nas plantas hospedeiras, no solo, na base das plantas hospedeiras, é possível que, quando você leve palha de arroz, você possa transportar os ovos juntamente com a carga. […] Então na remoção e no ato de levar de um local para o outro, você pode estar ajudando realmente a disseminar esse inseto”, ponderou.

O especialista fez um alerta ainda para os produtores que trabalham com a técnico do plantio direto na palha. “Principalmente para quem faz o plantio direto, ele tem que ter maior cuidado porque o inseto se desenvolve na sua planta hospedeira e também coloca as larvas, que ficam no solo”, expôs.

+ Leia aqui a publicação “Pulguinha-do-arroz (Chaetocnema sp.) (Coleoptera: Chrysomelidae): nova praga de pastagens no estado do Acre”

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Assista a entrevista completa com Rodrigo Santos no Giro do Boi desta quinta, 21:

Imagens cedidas pela Embrapa.