Agrônomo ajuda pecuarista a interpretar “linguagem de sinais” do pasto

Agrônomo ajuda produtor a sintonizar sua “antena” e captar sinais emitidos pela forrageira. "Princípio todo é baseado na fisiologia da planta", afirmou

Pecuarista, você sabe interpretar os sinais da linguagem que o pasto usa para se comunicar contigo? Em entrevista ao Giro do Boi desta segunda, 12, Dia de Nossa Senhora Aparecida, Dia da Criança e também Dia do Engenheiro Agrônomo, o professor titular da Esalq/USP Sila Carneiro da Silva, ele próprio doutor em agronomia de pastagens, elencou uma série de dicas para o pecuarista sintonizar sua “antena” e captar esses sinais emitidos pelas forrageiras.

“Pasto não fala, mas assim como o animal, que a gente desconfia que ele não está bem olhando para ele e aprendendo a ler os sinais que ele demonstra, e assim como em uma linguagem de sinais, que a gente também aprende a utilizar para se comunicar com o pessoas com deficiência auditiva, o pasto também emite sinais que permitem que a gente compreenda em que estado ele está do crescimento, em que situação ele se encontra no campo e quais as dificuldades que ele está atravessando em termo de crescimento ou de mau uso ou de bom uso e assim por diante”, comparou o agrônomo.

Sila destacou que o desafio dos pesquisadores é justamente facilitar a interpretação desta linguagem ao pecuarista que está no campo. “Assim como as grandes culturas agrícolas, todos os tratos culturais e ações de manejo são baseados em referenciais de campo, metas que correspondem a estado fisiológico do desenvolvimento das plantas”, observou.

Mas, segundo o professor da Esalq, o pasto tem um desafio especial em relação a outras culturas do agro. “O pasto é um tipo muito especial de cultura. É uma cultura que ao invés de a gente controlar a praga que consome a planta, a gente engorda a praga que consome a planta e vende a praga, inclusive. Então a gente quer aprender muito bem o sinal dela e, na Esalq, nós traduzimos esses sinais que a planta dá numa linguagem que é para ser muito simples de o produtor utilizar no campo”, sustentou.

Segundo Carneiro, os sinal mais básico é a altura do pasto. “A altura de manejo dos pastos. E como é que o pasto fala com a gente por meio da altura? […] Quando a gente está falando de lotação contínua, ou o popular pastejo contínuo, o pasto está dizendo para a gente o seguinte: se está subindo demais é porque está faltando boca. Tem pouco gado para a velocidade que o pasto cresce. O que você vai fazer a respeito? Vai deixar passar? Quando a altura está baixando demais rapidamente nesta situação, o pasto está dizendo claramente para a gente: ‘Olha, tem boca demais! Se você insistir, eu vou ficar rapado. E se rapar muito, dependendo da época do ano, eu vou acabar degradando e a invasora vai começar a tomar conta. O que você vai fazer a respeito?’”, exemplificou o pesquisador.

Silva também informou como o sinal é emitido no caso do pastejo rotacionado. “Se a gente entrar para o (pastejo) intermitente, ou rotativo, nós estamos falando das metas que caracterizam a hora de você interromper o crescimento do pasto e colocar os animais para fazer o pastejo e também da altura para você tirar os animais do pasto quando aquele pasto deve iniciar o descanso”, simplificou.

“Então aquelas são alturas que não devem ser transpostas, ultrapassadas porque elas indicam para a gente o momento exato que respeita a condição de o pasto ser capaz de se regenerar, de se recuperar, de estar pronto para produzir novamente infinitas vezes em quantidade e qualidade de forragem. […] O princípio todo é baseado na fisiologia da planta”, resumiu.

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A altura do pasto indica, conforme disse Carneiro em metáfora, se a planta tem “crédito” para comprar os mantimentos para a sua sobrevivência e, além disso, se desenvolver.

“O que é essa meta de altura, que é o sinal que o pasto passa para a gente? Basicamente todas as plantas, todas as culturas de uma maneira geral, precisam de luz para ter energia para absorver aquilo que a gente disponibiliza para elas na forma de água e nutrientes no solo. Esse é um processo que custa energia para a planta. Se ela não tem energia, ela não consegue absorver água nem nutrientes. É como se eu tivesse uma condição financeira ruim, como se eu não tivesse recursos financeiros, que seria a energia para a planta, e fosse ao supermercado para fazer compra. Na gôndola do supermercado, está tudo abastecido, lotado de mantimentos (nitrogênio, potássio, cálcio e magnésio), mas eu não tenho dinheiro no bolso para comprar aquela mercadoria. Então é como o solo estar bem fertilizado, bem corrigido, ter nutriente, água, mas a planta não tem energia para fazer uso. Então é essencial ela ter energia. E de onde vem a energia? A energia vem da fotossíntese, que transforma a energia luminosa do sol em energia química na forma de açúcar, que é o que a planta usa para tocar seus processos vitais, fazer folha, fazer colmo e fazer raízes para absorver nutrientes”, completou o professor.

O “crédito” que o pecuarista deve liberar no cartão do pasto é deixar que ele recupere suas folhas para fazer a fotossíntese. Muitas vezes, inclusive, o produtor impossibilita esta recuperação porque na transição da seca para as chuvas, ele antecipa o pastejo do gado, que acaba comendo a rebrota em um estágio inadequado.

“Na transição da seca para a estação chuvosa, quando o pasto está saindo do déficit hídrico mais intenso e começa, com as primeiras chuvas, a ter aquele estímulo para o crescimento inicial, a primeira rebrota, normalmente o pecuarista vem com uma falta de alimento muito grande. Ele está procurando qualquer coisa para o gado comer. Aí ele toma essa iniciativa de colocar o animal para comer a rebrota naquela fase inicial. Mas nessa hora o direcionamento da planta é todo para recuperar a parte aérea dela para poder crescer. E o animal em cima, consumindo aquela planta, aquele rebrote jovem – não vou nem falar do ponto de vista nutricional e de distúrbio metabólico por desbalanço de cálcio e magnésio na dieta, mas vamos falar da planta. O animal não tem o que comer e vai desfolhando muito frequentemente aquela planta e não deixa ela folhar. Então ela não faz fotossíntese suficiente para pagar os custos de vida dela. O que são esses custos de vida? A respiração das raízes e das partes vivas que ela tem. Então ela entra em balanço negativo de carbono […] e tira reserva dela própria para tentar manter a produção lá em cima, que está sendo tirada em uma velocidade muito alta. Ela começa a matar a raiz para jogar açúcar que estava na raiz para cima e com isso ela vai diminuindo massa de raízes, volume de solo explorado… até um ponto que a reserva acaba, que nem o saldo do cartão de crédito, que uma hora estoura e a fatura chega. A fatura é a degradação do pasto!”, acrescentou.

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Para identificar que a planta esteja em uma condição de balanço ótimo, o produtor deve entender que há uma altura que corresponde a este ponto, que é atingido quando o capim consegue absorver 95% de toda luz que incide sobre ele. Segundo Carneiro, neste momento há uma relação de área foliar e altura e que pode ser identificada com uma bastão, uma régua ou uma outra referência qualquer que o pecuarista tenha à disposição.

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“A altura de saída dos animais do pasto está relacionada tanto com o vigor de crescimento da planta no pasto quanto com o nível de consumo e desempenho dos animais no campo. É por isso que não é qualquer altura que a gente escolhe, por exemplo, para tirar os animais do pasto”, comentou.

Em sua participação no Giro do Boi, Sila Carneiro também deu dicas de adubação de pastagem. “Para você ter uma boa saúde, você tem que ter uma boa alimentação e uma vida regrada. O que é uma boa alimentação para o pasto? É uma fertilidade de base bem definida. Pasto é uma cultura forrageira tão exigente quanto qualquer cultura agrícola. Então ele precisa ter fósforo, um mínimo de saturação por bases, precisa ter equilíbrio de cálcio e magnésio. Essa é a fertilidade basal. O que é o acelerador de produção? É o nitrogênio. Ele vai dar para gente a condição de acelerar o crescimento da planta quando necessário para atender mais animais, servir mais bocas, se este for o objetivo do proprietário”, finalizou.

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Veja a entrevista completa com Sila Carneiro da Silva no vídeo abaixo: