Fazenda reduz marcas a fogo de até 12 para uma por animal sem prejudicar gestão

Propriedade de SP participa de experimento do módulo de bem-estar animal do Fazenda Nota 10, programa de capacitação em gestão e comparação de resultados

Uma propriedade não pode ser uma Fazenda Nota 10 sem focar nos avanços do bem-estar animal. Foi o que atestaram especialistas consultados em reportagem do Giro do Boi exibida no programa desta quarta-feira, dia 23. Foi por isso que no interior de SP, em São José dos Campos, a Fazenda São Clemente, propriedade da Agropecuária Marcondes César, se inspirou em um projeto de boas práticas para reduzir o uso da marca a fogo no seu rebanho (veja qual o projeto que inspirou o novo experimento acessando o link a seguir). As marcações, que chegaram a 12 por cabeça, agora foram reduzidas para apenas uma. E conforme destacou o próprio pecuarista Frederico Marcondes, sem prejudicar a gestão da fazenda, muito pelo contrário.

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“Nós tiramos 15 a 18 mil marcações a ferro por ano na fazenda e reduzimos de dez a 12 marcações a ferro por animal e fazemos agora uma única e pequena. E não temos perda de controle. Os machos são de ciclo curto na fazenda e com 18 a 24 meses já foram embora. Nas fêmeas, nós fazemos uma renovação de plantel em torno de 20% a 25% ao ano, de forma que as matrizes mais eradas, mais velhas, estão saindo da fazenda com cinco a seis anos, o que também é um ciclo curto. Nós entendemos que essa redução também trouxe um bem-estar animal, menos atividades para a equipe e, obviamente, mais resultado para o animal, que é refletido em ganho de peso, menos estresse, enfim, outra série de vantagens para o animal e para a propriedade”, aprovou Frederico.

Veja pelo link abaixo como o produtor substituiu a marcação a fogo:

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“Nós entendemos que uma Fazenda Nota 10 é uma propriedade que sempre se preocupa com as finanças, com a equipe, com o desenvolvimento de práticas sustentáveis e, naturalmente, uma preocupação enorme com o bem-estar dos animais”, observou o zootecnista e mestre em produção animal Antônio Chaker, diretor do Inttegra, que coordena o programa de capacitação em gestão e comparação de resultados Fazenda Nota 10, do qual faz parte a Fazenda São Clemente.

“Não há como você desenvolver uma fazenda profissional, uma Fazenda Nota 10 se os processos de manejo são processos agressivos, que não respeitam bem-estar animal, que não faz com que o manejo do dia a dia da fazenda seja um manejo que torna os animais mais produtivos. Então, filosoficamente, uma Fazenda Nota 10 é uma fazenda que tem no mais alto grau a prática do bem-estar animal”, completou Chaker.

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Dentro do Fazenda Nota 10, o módulo de bem-estar animal é conduzido pelo professor da Unesp de Jaboticabal-SP Mateus Paranhos, zootecnista, pós-doutor em bem-estar animal e coordenador do Grupo Etco, o Grupo de Estudos e Pesquisas em Etologia e Ecologia Animal. “Ninguém melhor do que o professor Mateus e sua equipe para estruturar um método de trabalho do bem-estar animal nessas fazendas que querem melhorar sempre. Então nós entendemos que não podemos em hipótese alguma negligenciar nem meio ambiente e muito menos bem-estar animal. Só com bem-estar animal a gente vai ter uma fazenda nota 10. Por isso que é uma pasta tão importante no programa”, afirmou o zootecnista.

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Paranhos, por sua vez, contextualizou a história do bem-estar animal no Brasil até que passou a fazer parte das preocupações cotidianas dos pecuaristas. “A história do bem-estar animal no Brasil é antiga, mas o grande impulso dentro das cadeias produtivas foi quando a gente começou a exportar, principalmente para países que têm uma demanda em relação à questão do bem-estar animal. No caso dos bovinos de corte, foi aquele momento por volta do ano 2000 de grande exportação para a Europa. Então havia uma pressão dos compradores de lá, que mandavam auditores para fazer as avaliações do manejo, principalmente durante o abate nas plantas frigoríficas. No ano 2000 nós tivemos esse grande boom que fortaleceu e criou oportunidades para a gente enfrentar os desafios que já estavam identificados”, relembrou o professor da Unesp.

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O pós-doutor em bem-estar animal elencou também quais eram esses desafios. “Por exemplo, a vacinação no passado era em qualquer lugar do corpo do animal, com os animais soltos no tronco coletivo, um pulava em cima do outro. Se o animal deitava, você não sabia se ele havia recebido a dose certa ou se por acaso havia recebido alguma dose. Tinha animal caindo, pessoas se machucando… Naquele momento, a gente começou um projeto, foi lá em Juruena, na Fazenda São Marcelo, para vacinar um a um os animais no tronco de contenção. E a conscientização veio com o tempo. A fazenda, com os dados, tomou a decisão: ‘aqui, a partir de hoje, nós vamos fazer assim’”, contou.

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A missão dos pesquisadores passou a ser espalhar esta mensagem de modo eficiente. “Mas como é que a gente espalha isso para todo mundo? Então foram treinamentos, conversas, programas, como o Giro do Boi e outros, a mídia toda ajudando. E isso hoje é uma regra. O que eu estou querendo dizer? Que é um processo. As mudanças vêm com o tempo e gradativamente se implantam. Hoje eu preciso falar pouco da vacinação no tronco de contenção porque a maioria das pessoas faz. Às vezes não fazem da melhor maneira possível, mas nós já chegamos no ponto de sintonia fina, do detalhe. Mas é uma prática que avançou, conquistou a maioria das pessoas, que perceberam que é mais seguro, é mais eficiente e, no fim das contas, é até mais rápido porque você tem menos acidentes acontecendo e a ação se implementa e generaliza. E as outras práticas de bem-estar animal, como desmama lado a lado, eu estou falando de rotinas de manejo, boas práticas em bem-estar, estão seguindo o mesmo caminho”, celebrou o coordenador do Grupo Etco. É o caso também da marcação a fogo, cuja substituição está sendo estudada por algumas propriedade que integram o programa Fazenda Nota 10.

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O zootecnista Antônio Chaker destacou a origem do Fazenda Nota 10. “O Fazenda Nota 10 começou em 2016 quando o grande objetivo era potencializar a capacidade de lucratividade de um grupo de propriedades que são fornecedoras do Friboi. Um dos grandes mentores foi o Fábio Dias (zootecnista e diretor de relacionamento com o pecuarista do Friboi), que nos convidou para poder estruturar um modelo de gestão. E naquele momento a gente iniciou com visitas presenciais, atendendo um pouco as propriedades, um trabalho de entendimento, de aprendizado. O resultado foi tão bom que nós entendemos que aquilo precisava impactar mais pessoas, então até o nome Conexão Gestão mudou para Fazenda Nota 10, o programa cresceu, trouxemos especialistas, trouxemos mais uma equipe importante para trabalhar. Na última safra, tivemos mais de 100 propriedades e agora estamos caminhando para 500 propriedades nesta safra nova. Aí no final o programa é comparar as fazendas para poder evoluir”, resumiu. As inscrições para a próxima temporada do Fazenda Nota 10 estão abertas, com o início programado para o mês de julho.

Abertas 500 novas vagas para o Fazenda Nota 10; saiba como se inscrever

De acordo com Frederico Marcondes, o programa já virou um pilar da Agropecuária Marcondes César. “Nós entendíamos antes do programa que o pilar de sustentação do nosso negócio seria constituído pelo manejo, sanidade, nutrição, recursos humanos e genética. Nós pensávamos que esses pilares iriam sustentar e fazer com que o negócio fosse altamente rentável. Mas percebemos que era um engano quando nós entramos no Fazenda Nota 10. Por quê? Porque nós começamos a ser ranqueados. Nós poderíamos ser a ponta boa ou a ponta ruim do negócio da pecuária de corte porque começamos a ser comparados com os melhores”, justificou o produtor.

“’A fazenda do fulano de tal tem um ganho médio diário dos animais de 800g? Então por que eu estou tendo 500g? O que acontece? Se ele pode, porque eu não posso?’ Então foi criado um ranking mostrando os indicadores importantes para mensurar, para avaliar, para você mexer e mudar. Então o Fazenda Nota 10 nos trouxe essa leitura, nos rankeou, nos comparou e hoje nós não podemos ficar sem ele porque ele é que nos dá o norte”, constatou. “O programa aponta se você precisa confinar, se precisa invernar, se precisa desafiar as fêmeas e demonstra que você precisa fazer isso porque todos estão fazendo e tendo resultado. Então eu entendo que o programa Fazenda Nota 10 não deveria ser um programa para poucos, tem que ser um programa para muitos porque, por exemplo, a partir do momento que você trouxer toda essa cadeia produtiva para um programa de melhoramento genético, o resultado é para todos, não é para uns. Mas eu estou convencido há três anos. […] Hoje o nosso pilar de sustentação, eu diria que o pilar do meio, que segura esse empreendimento, é o programa Fazenda Nota 10, que nos dá o direcionamento, o posicionamento e o rumo a seguir. Estamos nele, ele entrou para ficar em caráter definitivo em nosso negócio”, aprovou Frederico.

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O professor Mateus Paranhos também comemorou que o programa esteja abrindo as porteiras das fazendas e viabilizando a aceleração da implementação das práticas de bem-estar animais pelas propriedades de gado de corte de todo Brasil. “Primeiro é uma manifestação de felicidade. Nós realmente ficamos muito contentes de poder participar desse programa. Eu acho que é um programa que é democrático. Ele viabiliza a implementação não só das práticas administrativas, que foi a primeira etapa, agora a nossa presença também em todo monitoramento de saúde e bem-estar animal dentro desse mesmo esquema estratégico. A gente está muito feliz de participar com isso. O módulo está focando no que a gente chama de domínios do bem-estar, tem aspectos gerais, depois a gente tem foco na saúde, no ambiente, nas condições de nutrição e também do comportamento dos animais. Isso tudo está traçado dentro do questionário que cada um dos produtores vai ter que responder. A partir da análise das respostas dos questionários, os produtores vão receber um relatório personalizado, porque cada um vai ter um problema diferente, traçando, identificando um problema aqui e oferecendo já de imediato”, disse Paranhos, informando como são feitas as indicações para melhoria das fazendas participantes.

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Mas o coordenador do Grupo Etco também assumiu o compromisso de colocar a ciência para analisar casos que ainda tenham soluções desconhecidas. “Se a solução existir, vamos indicar a prática para resolver ou minimizar, por exemplo. Quando a gente identificar um problema que ainda não tem solução disponível, obviamente a gente vai lançar mão de uma ação de pesquisa para encontrar a solução para o problema”, afirmou.

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Pelo vídeo a seguir é possível assistir a reportagem completa sobre o módulo de bem-estar animal dentro do programa Fazenda Nota 10: