Pesquisadores descobrem 'exército aliado' para controle biológico de carrapatos

Valendo-se do poder da natureza, startup desenvolveu produto a base de fungos, inimigos naturais do carrapato, para combater infestação em animais e pastagens

Um grupos de pesquisadores está propondo uma solução inovadora para controlar carrapato na pecuária – estimativas apontam que o parasita é responsável por causar prejuízos na ordem de US$ 3,2 bi ao setor todos os anos. Trata-se do primeiro produto para o controle biológico dos ectoparasitas, um verdadeiro “exército aliado” formado por duas espécies de fungos e que são inimigos naturais destes artrópodes.

Nesta quarta, 04, um dos profissionais responsáveis pela inovação, o biólogo Lucas Von Zuben, mestre e doutor em ecologia química, falou sobre a tecnologia ao Giro do Boi. O projeto começou ainda em 2015, a partir de um financiamento da Fapesp, a Fundação de Amparo à pesquisa do estado de São Paulo, e atualmente está sendo desenvolvido pela Decoy Smart Control, uma startup de biotecnologia que tem como proposta promover o controle biológico de pragas para diminuir sua influência negativa na produtividade e na qualidade dos alimentos.

“A gente usou a lógica, foi na base da biologia, estudar a natureza. Todo mundo sabe, e o produtor rural melhor do que ninguém, que a natureza é sábia. A natureza é sábia e poderosa. Ela se protege. Então a gente foi atrás de estudar a natureza, conhecer o carrapato, entender o ciclo de vida dele, entender os problemas que ele enfrenta e a gente achou o inimigo natural do carrapato, que é um fungo. Ou seja, ele já está no ambiente, já está por aí, ele infecta o carrapato, e quando ele infecta o carrapato, ele mata. Quando ele entra dentro do carrapato, ela solta umas enzimas que vão digerir o carrapato por dentro e aí ele mata o carrapato. Se as condições ambientais forem favoráveis, ele vai se reproduzir, liberando outros esporos que vão infectar outros carrapatos, gerando um efeito em cadeia, que potencializa o controle do carrapato. É um processo que já acontece na natureza, o que a gente faz é levar o poder natureza para o lugar certo na hora certa”, detalhou Von Zuben.

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Depois de aplicado, os fungos começam a agir a partir de dois a três dias, sendo que a morte dos carrapatos já é expressiva pela observação a partir de sete dias, conforme mostrou o biólogo em imagens registradas durante a pesquisa.

Von Zuben falou ainda sobre um dos grandes desafios que o produtor tem na luta contra o carrapato, que é controlar a infestação não só nos animais, como também no pasto, onde está 95% da população dos parasitas de uma fazenda. “Só 5% estão no animal, mas estes 5% que dão dor de cabeça e o prejuízo para o produtor. E a fonte do problema está na pastagem. E a nossa ideia é fazer um controle estratégico, que você consiga, de fato, reduzir a população desta praga. Então a gente tem um produto que é aplicado no animal e um produto que é aplicado na pastagem e a gente propõe um tratamento que é combinado entre os dois […], de maneira que você consiga reduzir a população total desta praga na propriedade”, explicou

Para esclarecer como funciona, na prática, a ação dos produtos, o biólogo fez uma comparação ilustrativa. “Imagine que o carrapato é um exército inimigo, e é um exército de milhares. O que a gente faz levando o fungo para o campo é que a gente leva um ‘exército aliado’. E o exército aliado de fungos é um exército de bilhões. Cada frasco do Biovalente, que é para aplicar no animal, ou do Biopasto, que é para aplicar na pastagem, tem mais de 6 bilhões de esporos do fungo, que são inimigos naturais do carrapato, e cada esporo é suficiente para matar um carrapato”, relatou.

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Segundo o pesquisador, os produtos seguem um protocolo de aplicação para garantir sua eficácia máxima, dentro de um período que varia conforme o grau de infestação. “A gente tem um protocolo padrão, que é uma pulverização a cada 21 dias. É um tratamento de longo prazo que a gente propõe. Mas este intervalo pode ser tanto aumentado como reduzido, dependendo da infestação. E como ele não faz mal, não tem problema, você pode aplicar toda semana”, assegurou.

Uma das vantagens da tecnologia é que o produto não deixa resíduos na carne ou no leite, ou seja, não precisa de um prazo de carência. Também não é tóxico nem para os humanos, nem para os animais, sejam bovinos, equinos, caninos, ovinos, etc., o que tira a preocupação com abortos das vacas ou mortes de bezerros e animais debilitados. Segundo Von Zuben, também pode ser aplicado junto a outros produtos convencionais e, como se trata de um inimigo natural dos ectoparasitas, não tem problemas com resistência ao seu método de controle. “Completamente seguro para o animal, completamente seguro para quem aplica, completamente seguro para quem consome, completamente seguro para o meio ambiente. É o que a gente diz. É um controle seguro com o poder da natureza”, frisou o empreendedor.

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Enquanto ainda aguarda a aprovação do documentos junto ao Mapa – Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento – para iniciar sua comercialização, os produtos estão sendo testados em propriedades que se dispõem a contribuir com a coleta de dados sobre o produto. Os pecuaristas interessados podem entrar em contato com a companhia por meio do telefone (16) 3315 0735 (sala 301) ou e-mail [email protected]. Mais detalhes estão disponíveis pelo site da startup.

“A gente está nesta fase de documento e registro no Mapa, mas a gente estabelece parceria com os produtores que querem conhecer a tecnologia. […] Porque a gente não pode ficar dentro do laboratório esperando a coisa acontecer, e é o que a gente fez desde o começo do desenvolvimento deste produto. A gente tem que estar em contato com o produtor rural, em contato com quem sofre o problema, e ele passando informação para a gente sobre a tecnologia”, respaldou.

Segundo Von Zuben, o custo médio do tratamento gira em torno de R$ 4,50 por cabeça ao mês.

Veja a entrevista completa pelo vídeo abaixo: