Quais foram os avanços jurídicos do agro em 2020 e o que esperar para 2021?

Especialista comentou mudanças na Lei da Liberdade Econômica, NR 31, Lei do Agro, posse de arma em propriedade rural e demonstrou otimismo para 2021

O Giro do Boi desta terça, 19, levou ao ar entrevista com a advogada especialista em direito agrário, ambiental e agronegócios Júlia Bastos para resumir os avanços jurídico do setor no desafiador ano de 2020, sobretudo por conta da pandemia, e apontar quais serão os desafios para 2021.

“Eu acredito que apesar de todos os problemas que a gente teve ano passado e ainda vem enfrentando, a gente teve um olhar diferenciado para o agronegócio em 2020. O governo tem dado mais atenção, o Ministério da Agricultura tem feito um bom trabalho e eu acredito que esse ano vai ser de muita prosperidade. Afinal, mesmo com tudo em crise, o agro continua nos sustentando, a gente não teve nenhum problema com desabastecimento da sociedade, a gente viu diversos países com falta de arroz, por exemplo, e aqui a gente não teve esse problema de forma nenhuma”, reconheceu a consultora.

Quando a crise chegou, o Agro já estava pronto

“2020 foi um ano para a gente se adaptar ao novo mundo. A gente já vinha numa toada de desburocratização dos processos administrativos, de uma virtualização maior. Mas foi um ano de adaptação, eu acredito. A gente aprendeu a se adaptar às diversidades, aos fatos que acontecem e vão continuar acontecendo na história da humanidade e acredito que agora, esse ano que está aí, 2021, vai ser um ano em que a gente já está adaptada para fazer acontecer”, projetou.

“É um caminho sem volta, a gente vai ter que se acostumar mesmo a ser mais ágil nos nossos processo e desburocratizar, tornar a vida do cidadão mais fácil porque às vezes trava em um probleminha que poderia ser resolvido com um aperto de botão. Então acredito que isso realmente vá ser um marco agora desse ano em diante, a digitalização, virtualização dos processos, e é preciso que a conexão chegue ao produtor. A gente fala do Brasil, mas a gente não está falando só dos grandes produtores, que têm acesso aos grandes centros, a uma consultoria talvez. Mas são muitos pequenos e médios produtores, então é importante que essa nova modernidade chegue também nessas pessoas”, sustentou.

Veja abaixo as principais mudanças no que diz respeito ao direito agrário ao longo de 2020.

DESAFIOS

“Em primeiro lugar, é importante a gente pontuar que 2020 já começou com uma mudança de mentalidade política do governo. A gente até conversou em 2019 sobre a Lei de Liberdade Econômica, então o governo federal se preocupou em desburocratizar esses processos legislativos, judiciários e administrativos também. Logo no começo de 2020, a gente já trouxe essa mentalidade de desburocratização. No começo do ano, antes de entrar a pandemia, a gente teve uma forte seca no Sul do país, no Rio Grande do Sul, e aí vieram vários movimentos políticos e sociais para conseguir prorrogações dessas dívidas junto ao Banco Central. E a gente conseguiu essa legislação para favorecer esses produtores afetados pela seca no começo do ano, logo depois veio a pandemia e isso desequilibrou todo mundo, não só o governo. Mas eu acredito que o Ministério da Agricultura fez um trabalho excelente com isso, criaram um grupo de crise imediatamente para continuar o abastecimento e circulação de mercadorias e tivemos o auxílio emergencial voltado para os pequenos produtores, para os agricultores familiares superarem a dificuldade da pandemia”.

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POSSE/PORTE DE ARMA

“Além disso, nessa pegada da liberdade econômica e da desburocratização dos processos, a gente teve uma alteração na legislação de posse de arma para produtor rural. Os produtores que têm a posse de arma conseguem agora usar esta arma em toda a extensão da propriedade agora, não mais apenas na sede, e ampliou também o número de armas por CPF. Antes eram duas, agora são quatro por CPF”.

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NR 31

“A gente teve agora no fim de 2020 a questão da mudança da NR 31, que é uma norma trabalhista que era muito criticada pelo setor do agronegócio porque ela dificultava muito a relação trabalhista. Teve uma mudança das normas em relação a camas, dormitórios e ela começou a valer em outubro do ano passado. Eu acredito que a pandemia impulsionou um pouco isso também porque era inviável, eram muitas autuações. Com essa nova legislação a gente economizou mais de R$ 3 milhões em autuações trabalhistas, então isso é bem representativo para o setor”.

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LEI DO AGRO

“Um marco muito importante que a gente teve esse ano foi a conversão da MP do Agro para Lei do Agro, que teve impactos fortíssimos no crédito rural. A gente tem a questão do fundo de aval solidário, que é quando produtores podem se associar num fundo garantidor para ter uma garantia maior e conseguir um crédito maior. Isso é bom tanto para a instituição financeira, que tem essa garantia mais segura quanto para o produtor que pode ter mais acesso ao crédito. Além disso, teve o patrimônio de afetação rural porque, antes dessa lei, o produtor tinha que dar toda a propriedade, independente do valor do crédito, mesmo que o crédito fosse bem menor do que o valor da propriedade, às vezes ele tinha que dar alienação fiduciária, o que gera alguns transtorno caso ele não pague. Agora existe a possibilidade de pegar parte desta propriedade rural e dar como garantia ao invés de toda a propriedade. Isso é importante e vamos ver como vai ser na prática”.

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CONECTIVIDADE NA PANDEMIA

“A maior dificuldade do produtor em relação à pandemia é o acesso à tecnologia e à internet, principalmente. a gente tem um problema sério no Brasil ainda em relação à conectividade no campo. Então, às vezes, (há dificuldade) de participar de alguma audiência virtual ou até mesmo reunião com o cliente para explicar algum problema. Isso foi um entrave porque se o produtor que é mais velho e não tem alguém, algum apoio tecnológico, alguém mais novo na família, fica complicado. É uma mudança cultural que a gente está vendo”.

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SECA E QUEIMADAS

“Foi uma questão bem complicada porque a matéria ambiental já está em pauta há muito tempo, principalmente em relação à demanda da Europa. Então a gente precisa cuidar disso e precisa desconstruir também o mito de que as queimadas foram causadas pelos produtores. Os produtores, na verdade, foram vítimas. Na maioria das vezes quem causa queimada proposital é um criminoso, não é um produtor rural de bem. Eu acredito que a gente tenha que voltar o olhar esse ano mais para essas questões ambientais. A gente sabe que nessa época do ano tem esse problema e esse ano de 2020 foi uma coisa bem atípica. Mas o governo junto com os próprios produtores devem se conscientizar para a gente conseguir evitar isso ao invés de ficar apagando incêndio, literalmente”.

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PROJEÇÃO PARA 2021

“Existem vários projetos de lei e a gente está vivendo um momento de rastreabilidade dos alimentos, de maior segurança dos alimentos. segurança alimentar a gente já tem, mas é na questão de sanidade que, com o coronavírus, a gente percebeu a importância da sanidade animal e vegetal e a questão da rastreabilidade vai ajudar isso. Então acho que esse é o caminho para 2021”.

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1º CONGRESSO DAS MULHERES AGRARISTAS DO BRASIL

“A gente fez o primeiro Congresso das Mulheres Agraristas do Brasil, tivemos mulheres vindo desde o Sul até do Norte do país, que são advogadas, voltam o olhar para a questão do direito agrário, para o desenvolvimento do agrarismo no Brasil. Foi muito bacana, a gente teve a presença do secretário-executivo do Mapa, da Teresa Vendramini (Teka) na sede da Sociedade Rural Brasileira. Foi muito bacana, esse movimento de mulheres tem crescido bastante e acredito que a gente só tenha a agregar ao setor”.

RECADO AOS PRODUTORES

“A primeira coisa que eu queria falar para o produtor é para ele não desesperar. Todo mundo passou por um momento muito delicado e agora a gente está tendo um apoio maior, um olhar maior do governo para o setor do agronegócio, então procure uma assistência técnica, uma assessoria para poder resolver os problemas e começar esse ano com o pé direito”.

Veja a entrevista completa com Júlia Bastos pelo link a seguir:

Imagem: Reprodução / Prefeitura Municiapl de Assú-RN