Rastreabilidade custa menos de 10% do potencial de bônus para o pecuarista

Em entrevista, empresário lembrou, entretanto, que benefícios vão além dos ganhos financeiros diretos, impactando também na gestão do negócio

A rastreabilidade bovina custa cerca de R$ 6,00 por cabeça, em média, e tem um potencial de retornar R$ 4,00 por arroba pela valorização da carne tipo exportação produzida. Em um animal de 20 arrobas de peso, o retorno seria de R$ 80,00 por cabeça, com uma margem, portanto, de R$ 74,00 por cabeça. Foi a conta que apresentou em entrevista ao Giro do Boi o administrador Lucas Recaldes de Souza, CEO da Recaldes Rastreabilidade.

“São R$ 6,00 em média, e aí está incluído tudo: brinco, certificação, vistoria, deslocamento, custos operacionais. A média nacional é R$ 6,00 por cabeça. (O retorno é de) No mínimo R$ 4,00 por arroba. R$ 80,00 num animal de 20@. São R$ 74,00 por cabeça (de margem), confirmou.

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Mas de acordo com o empresário, os benefícios da rastreabilidade vão além do retorno direto com a agregação de valor na arroba produzida. “O pecuarista tem o ganho gerencial de toda a propriedade. Em que piquete o gado está, qual lote, quem ganhou mais peso, quem foi o melhor fornecedor que vendeu gado magro para ele quando foi para o confinamento… Tem uma questão financeira também, porque informa o custo operacional, o que sobrou por cabeça identificando o animal. Hoje eu não vejo uma propriedade, como um confinamento, funcionando sem a identificação. Como você vai ter um controle gerencial disso, o quanto ganhou ou deixou de ganhar? Como você vai anotar num papel, com uma caneta?”, salientou Recaldes.

O empreendedor ressaltou que muitas fazendas já usam o brinco de identificação, mas ainda não têm a certificação do Sisbov, cujo custo seria muito similar. “Muitas fazendas que não usam o Sisbov usam o brinco de manejo. Elas estão fazendo o mesmo investimento, pois o custo é praticamente igual, só que sem a rentabilidade financeira”, apontou.

Em sua entrevista, Recaldes respondeu se há um determinado tamanho de fazenda que pode usar a tecnologia. “Todo mundo pode. Geralmente as pessoas acham que a certificação é para grandes confinamentos, grandes fazendas. Não! O pecuarista pode ter 100, 50 cabeças. A questão é gerencial do abate dele. Pode ter 200, 300 animais. O custo eleva um pouco (fica menos diluído) quando você tem uma quantidade menor, mas dependendo da certificadora, algumas cobram até menos honorários quando a fazenda é menor e cobram mais quando tem mais gado. Mas o produtor pode certificar por questão gerencial. Enfim, se ele abate 50 cabeças, vai ganhar bônus em 50 animais”, afirmou.

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Recalde lamentou, entretanto, que no Brasil somente cerca de 1.700 propriedades estejam habilitadas pelo Sisbov. “Alguns pecuaristas não acreditam, primeiramente, que o frigorífico pague por isso, que bonifica se ele rastrear o gado e identificar. O segunda problema é que eles acham muito burocrático o processo. Não é só brincar os animais, tem todo um processo que tem que seguir de entrada, saída, então eles acham um pouco difícil. Mas dessas 1.700 fazendas, eu acredito que todas sejam gerenciadas pessoas que enxergam a propriedade como uma empresa, que são empresários. O pecuarista tradicional mesmo é um pouco mais complicado para colocar (a rastreabilidade). Agora a próxima geração que está vindo, os filhos deles, os netos que estão começando a abrir a mente para isso aí”, projetou.

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Embora haja de fato um processo complexo para a habilitação de uma propriedade no Sisbov, o especialista assegurou que o “trabalho pesado” fica por conta das certificadores. “São 19 empresas certificadoras no Brasil habilitadas pelo Ministério (da Agricultura, Pecuária e Abastecimento). Hoje nós temos manual operacional, técnicos qualificados que treinam, que orientam e deixam tudo bem instruído, como o processo é feito para que os pecuaristas ganhem essa bonificação no final. O processo em si é muito complicado internamento para a certificadora, mas para o produtor é muito mais prático, é muito mais fácil”, tranquilizou.

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Recaldes observou o que deve mudar para que mais fazendas possam integrar o sistema de rastreabilidade. “O primeiro passo é abrir a mente dos produtores que acreditam que isso é burocrático. Ele deve entender como funciona um todo. Eu costumo dizer que a fazenda é uma pré-indústria, ela está fornecendo carne e alimento para o mundo, então tem que se capacitar como se fosse uma indústria mesmo”, comentou.

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O empresário revelou qual o prazo para que uma fazenda que solicite hoje seu ingresso no Sisbov esteja de fato habilitada. “É rápido! Quando a fazenda produz gado a pasto, em torno de 160 dias. Por que isso? Porque tem uma normativa nova do ministério, uma legislação que não pode mais fazer a vistoria e já pedir auditoria. O ministério tem que auditar a propriedade para verificar se os procedimentos foram todos feitos corretamente. Então, em média, um confinamento leva 90 dias, e isso depende da demanda, de o auditor ir até a propriedade, e uma fazenda que engorda a pasto, 160 dias”, resumiu.

Recaldes tirou ainda uma dúvida de um produtor sobre a possibilidade de mudar a cor do brinco ano a ano para facilitar a identificação. “Essa é uma pergunta que muitos pecuaristas fazem porque os brincos são todos amarelos. A cor amarelo é definida pelo ministério, mas você pode mudar o machinho. O machinho não precisa ser amarelo. Muitas propriedades usam o machinho de cor diferente para identificar. Por exemplo, na propriedade que tem gado de quatro produtores diferente, pega um machinho para cada produtor de cor diferente. Você vai identificar do mesmo jeito. Mude a cor do machinho que vai dar certo”, sugeriu.

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Recaldes reforçou ainda que as fazendas que desejam agregar valor exportando a carne produzida pela Cota Hilton devem prestar atenção aos critérios. “Até os dez meses. O primeiro princípio da Cota Hilton, e muitas pessoas não sabem disso, é rastrear os animais antes dos dez meses de idade. Não é só ser brincado, ele tem que estar no banco de dados do ministério com até dez meses. Se ele for identificado depois dos dez meses e mandar para a certificadora, o pecuarista já perdeu a oportunidade. Passou dez meses e um dia, já foi. Aí ele só conseguiria agregar valor pela Lista Trace (obtenção de metade do bônus, cerca de R$ 2,00 por arroba). Por isso a gente fala, para exportar pela Cota Hilton, na desmama, sete ou oito meses, brinque o animal, manda para a certificadora, ela vai inserir esses animais. É o primeiro princípio. Depois disso, tem que ser uma propriedade que está apta à exportação. Não adianta só brincar o gado e mandar para a certificadora para exportar à União Europeia. Não vai adiantar, pois a propriedade tem que estar na Lista Trace, que é auditada pelo ministério”, reforçou.

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O administrador comentou ainda a recente mudança na gestão do Sisbov no Brasil, agora feita pela CNA, a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil. “O que a gente achou mais prático? Havia demora pelo ministério antigamente. Você tinha que mandar ofício, mas os técnicos do ministério não tinham só a parte de Sisbov para gerenciar, eles tinham outros departamentos. A CNA veio justamente para resolver isso. Hoje você tem um canal direto com a CNA para solicitação de brinco, para reportar falhas no sistema operacional. E a CNA está introduzindo, está discutindo, está querendo conversar para aumentar o ágio para o produtor rural. Do meu ponto de vista, eu acho que veio para ajudar, para somar, para desburocratizar um pouco a parte do ministério, que deve ficar somente com a parte da auditoria. Porque hoje tem inclusive muitas auditorias paradas por falta de técnico do ministério”, opinou.

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Pelo vídeo a seguir é possível assistir a entrevista completa com o administrador e CEO da Recaldes Rastreabilidade, Lucas Recaldes de Souza: